Dia de conscientização do Autismo
1 a cada 36 crianças tem autismo, diz CDC; entenda por que número de casos aumentou tanto nas últimas décadas No Dia da Conscientização do Autismo, especialistas ouvidos explicam que diagnósticos estão mais acessíveis a populações desassistidas. Fatores ambientais, como idade avançada dos pais, também podem contribuir para uma variação no número de pessoas com TEA. DIA MUNDIAL DA CONSCIENTIZAÇÃO Entenda como o diagnóstico do espectro do autismo se tornou mais fácil e frequente
Entender como o diagnóstico do espectro do autismo se tornou mais fácil e frequente
O Transtorno do espectro autista (TEA) atende a diferentes condições marcadas por alterações no desenvolvimento nervoso relacionado a dificuldades de relacionamento social.
Aspectos no neurodesenvolvimento da criança podem ser percebidos nos primeiros meses de vida
Aspectos no neurodesenvolvimento da criança podem ser percebidos nos primeiros meses de vida.
O Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado neste domingo (2), destaca a importância do diagnóstico adequado, do acompanhamento especializado e da inclusão social.
O transtorno do espectro autista (TEA) apresenta diferentes condições marcadas por alterações no desenvolvimento nervoso relacionado a dificuldades de relacionamento social.
Estima-se que em todo o mundo cerca de 1 em cada 100 crianças têm autismo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), essa estimativa representa um valor médio, e a prevalência relatada varia entre os estudos. Algumas pesquisas controladas, no entanto, indicaram números de voos mais altos. Além disso, a prevalência do autismo em muitos países de baixa e média renda é desconhecida.
No Brasil, os estudos de prevalência da condição são escassos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu uma pergunta sobre autismo no questionário da amostra do Censo Demográfico 2022. No entanto, os resultados ainda não estão disponíveis, segundo o instituto.
De acordo com o Ministério da Saúde, os sinais de impactos no neurodesenvolvimento da criança podem ser percebidos nos primeiros meses de vida, com o diagnóstico estabelecido por volta dos 2 a 3 anos de idade. Além disso, a prevalência do distúrbio é maior entre indivíduos do sexo masculino.
O termo “espectro” é utilizado para englobar situações e apresentações muito diferentes da condição, que vão de níveis leves a graves. Entre os sinais estão dificuldade de comunicação por deficiência no domínio da linguagem e no uso da imaginação para lidar com jogos simbólicos, dificuldade de socialização e padrão de comportamento restritivo e repetitivo.
“Atualmente, mais precisamente desde 2013, utilizamos o termo transtorno do espectro autista, ao invés de somente autismo, visto que há uma diversidade de sinais e sintomas e níveis de intensidade desses, diferentes em cada indivíduo portador do quadro”, explica Leandro Gama, neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo.
Especialistas em saúde mental e infantil alertam que a identificação de atrasos no desenvolvimento bem como o diagnóstico oportuno permitem a realização de intervenções comportamentais e apoio educacional de maneira precoce, levando a melhorias na qualidade de vida a longo prazo.
As causas do transtorno do espectro autista ainda permanecem desconhecida. Evidências científicas apontam que não há uma causa única, mas uma interação de fatores genéticos e ambientais.
Aperfeiçoamento do diagnóstico
Aspectos no neurodesenvolvimento da criança podem ser percebidos nos primeiros meses de vida, sendo o diagnóstico estabelecido na primeira infância, entre 2 e 3 anos.
Os sintomas incluem dificuldades no aprendizado ou no uso da linguagem, aparente indiferença aos cuidadores, agitação sem explicação clara e comportamentos repetitivos ou estranhos, como balançar-se para a frente e para trás ou criar rotinas específicas para momentos triviais como as refeições, por exemplo. Quando essas rotinas são quebradas, a pessoa pode apresentar reações que parecem incompreensíveis ou desproporcionais para quem está acompanhando.
A identificação de atrasos no desenvolvimento, o diagnóstico oportuno do TEA e o encaminhamento para intervenções comportamentais e o apoio educacional na idade mais precoce possível podem levar a melhores resultados a longo prazo, considerando as características da formação cerebral.
O diagnóstico da condição é essencialmente clínico, feito a partir das observações da criança, entrevistas com os pais e aplicação de instrumentos específicos, como explica a neuropediatra Christiane Cobas, do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.
“O diagnóstico do transtorno do espectro autista é clínico, não é preciso nenhum exame laboratorial para confirmar o diagnóstico. Se o paciente apresenta algumas características clínicas, o médico está autorizado a fechar o diagnóstico de transtorno do espectro do autismo. Hoje, são considerados dois critérios. O primeiro é dificuldade na comunicação e interação social. O segundo critério envolve comportamentos restritos e repetitivos, como alguma rigidez cognitiva, ter que seguir uma rotina muito rígida senão a pessoa se desorganiza e seletividade alimentar, por exemplo”, afirma.
Segundo os especialistas, não há consenso se há um aumento dos casos da doença ou na detecção da condição.
“Ainda é complexo afirmar se os casos estão aumentando ou se estamos tendo mais diagnósticos. Algumas linhas de estudos falam em aumento dos casos, e outros mostram que atualmente temos uma estruturação dos critérios diagnósticos melhor e maior conhecimento do quadro, o que facilita chegarmos ao diagnóstico”, afirma Gama.
“Particularmente acredito que esse número está aumentando sim. O motivo não sabemos, existem causas genéticas, mas também existem causas ambientais que podem aumentar a incidência do autismo”, complementa Christiane.
Ao longo das décadas, a identificação do espectro do autismo foi aperfeiçoada. Agora, é mais fácil identificar a condição na infância e essa descoberta tem sido mais frequente, de acordo com a fonoaudióloga Fernanda Dreux Miranda Fernandes, professora associada livre-docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
“O desenvolvimento das pesquisas e dos estudos em linguagem, educação e psicologia levou ao desenvolvimento de técnicas e de métodos que proporcionam um bom desenvolvimento de um potencial que antes não era considerado para essas crianças. Dessa forma, algumas mudanças nos critérios do diagnóstico fizeram com que o diagnóstico de autismo passasse a ser muito mais frequente. Hoje, calcula-se que haja uma criança autista em cada 70 crianças, quer dizer, é mais do que 1% da população de crianças”, afirma Fernanda.
Instrumentos de vigilância do desenvolvimento infantil, sensíveis para detecção de alterações sugestivas de TEA, podem ser aplicados durante as consultas de puericultura na Atenção Primária à Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS). O relato da família acerca de alterações no desenvolvimento ou comportamento da criança, por exemplo, tem correlação positiva com confirmação diagnóstica posterior.
Segundo a fonoaudióloga da USP, o principal desafio para os pais é a questão da comunicação. Entre as preocupações estão os possíveis impactos da condição sobre a capacidade de fala, de relacionamento e de autonomia.
A professora esclarece que cada quadro de autismo é avaliado de maneira diferente. Algumas crianças poderiam nem ter a síndrome identificada na escola. Outras podem precisar de algum auxiliar de ensino. Em menor proporção, há ainda crianças para as quais a melhor indicação é uma instituição especial, que vai oferecer um acolhimento em relação às dificuldades de comportamento, sociais e cognitivas, que elas manifestarão. Estudo realizado pela fonoaudióloga mostrou que o processo de aprendizado nas crianças autistas não difere muito de crianças com neurodesenvolvimento comum.
O psiquiatra Erikson Felipe Furtado, professor do Departamento de Neurociências e Ciências do Comportamento da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, afirma que existem várias causas possíveis que podem desencadear o autismo. Muitas vezes, são considerados a idade dos pais e fatores externos que podem interferir durante a gestação do feto, como álcool e medicamentos, além de condições genéticas.
“Falar de fatores de risco é falar de uma quantidade enorme de fatores; de qualquer maneira, tudo aquilo que uma gestante faz para cuidar da saúde do bebê é benéfico”, ressalta.
Tratamento
O Sistema Único de Saúde (SUS) conta com uma rede de apoio e assistência a pacientes com a condição. Na Atenção Especializada da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, por exemplo, as pessoas com TEA e seus familiares contam com Centros Especializados em Reabilitação (CER), que são pontos de atenção ambulatorial especializada em reabilitação, responsáveis por diagnóstico, tratamento, concessão, adaptação e manutenção de tecnologia de apoio.
A função dos profissionais é estabelecer o impacto e repercussões no desenvolvimento global e processo terapêutico, a fim de estabelecer um Projeto Terapêutico Singular (PTS). O PTS é um conjunto de propostas e condutas terapêuticas articuladas para promover o bem-estar do paciente de forma interdisciplinar.
Os tratamentos indispensáveis incluem intervenções educativas, socioeducativas e reabilitativas. Há ainda o tratamento médico e psiquiátrico para as limitações funcionais e de linguagem, a agitação, a limitação motora e, como muitas vezes acontece, o tratamento de outro diagnóstico que pode vir acompanhado com o autismo, como o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
“Podemos dizer o seguinte: quanto mais cedo essas medidas forem introduzidas, especialmente aquelas que envolvem a comunicação, maior o impacto no futuro do indivíduo com TEA, que vai melhorar o seu prognóstico ao longo da vida”, diz o especialista.
Diferentes tipos de autismo
As manifestações clínicas permitem a classificação do TEA em diferentes categorias.
O chamado “autismo clássico” conta com graus de comprometimento que variam entre as pessoas. De maneira geral, os indivíduos tendem a se voltar para si mesmos, deixando de estabelecer contato visual com as pessoas ou com o ambiente. Embora consigam falar, podem não utilizar a fala como ferramenta de comunicação.
Nessa forma de autismo, as pessoas podem entender enunciados simples, mas apresentam dificuldades para compreensão. Por se apegarem ao sentido literal das palavras, não compreendem metáforas e nem contextos de duplo sentido.
Nas formas mais graves do autismo clássico, há uma ausência completa de qualquer contato interpessoal. Em geral, são crianças isoladas, que não aprendem a falar, não olham para as outras pessoas nos olhos, não retribuem sorrisos e repetem movimentos.
Outra categoria é o autismo de alto desempenho, chamado anteriormente de síndrome de Asperger. Os indivíduos apresentam dificuldades semelhantes às outras formas de autismo, mas numa medida bem reduzida.
Apesar das dificuldades para interagir socialmente, compreender e expressar emoções, as pessoas com a forma mais leve de autismo conseguem se expressar verbalmente e emocionar-se papeis que entraram em concentração, especialmente pelo foco exagerado em um assunto específico, característica comum associada a esse espectro .
Há ainda o “distúrbio global do desenvolvimento sem outra especificação“, que inclui indivíduos considerados dentro do espectro do autismo, com dificuldade de comunicação e de interação social, mas com sintomas insuficientes para inclusão em outras categorias do transtorno.